Enquanto procuro uma nova aposta gastronômica na cidade, me deparo com a ameaça de um inimigo invisível ─ e potencialmente letal ─ que ronda os bares: o metanol. Até agora, o país registrou 24 casos de intoxicação após o consumo de bebidas alcoólicas, com 16 mortes notificadas, 5 delas confirmadas. Eu, assim como tantos outros apreciadores de bons drinks, me vi obrigado a suspender o álcool por algumas semanas, até que seja seguro voltar a brindar sem medo.
A combinação de vodca, licor de laranja, suco de cranberry (ou de limão) e gelo é praticamente um convite para a diversão: abre a noite, prepara o clima antes de um date, ou celebra a vida com os amigos.
Mas só de imaginar essa mistura se transformando em ácido fórmico dentro de mim, sinto-me capaz de fazer votos eternos de abstinência alcoólica. Pelo visto, esse ácido não está para brincadeira: compromete órgãos vitais e de quebra faz meu drink favorito se parecer uma roleta russa líquida.
Lei seca
No auge da minha abstinência, imposta pelo rigor da lei seca que meu próprio instinto de sobrevivência decretou, os bares se tornaram território inimigo.
Foi então que (re)descobri abrigo nos cafés, com sua atmosfera aconchegante, ao som de jazz de Coltrane ao fundo, e muitos cappuccinos acompanhados de tortas de limão e croissants amanteigados.
Trocar o álcool pelo açúcar talvez não tenha sido uma permuta das mais saudáveis, mas, pelo menos por ora, me pareceu a opção mais segura — e, convenhamos, mais doce também.
Diferente de uma mesa de bar, onde o garçom serve sistematicamente uma bebida atrás da outra, a luz baixa de um bistrô garante que a conversa (e o flerte) siga no mesmo tom, apenas com uma trilha sonora diferente. Trocar os clichês da música popular brasileira, em voz e violão, por composições de jazz não me parece nada mau.
Enquanto degusto um mocha com chocolate branco em uma típica noite fria, numa cidade úmida e estridente, vozes acaloradas e dissonantes ao meu redor debatem se a insistência em um flerte poderia (ou não) ser uma estratégia eficaz numa investida pelo Instagram, tipo um: “ei, sumido!”, ou, talvez, “nunca mais nos falamos desde a última vez que nos vimos, hen!”. Qual seria a sua opinião?
De volta ao passado
Como se não bastasse, nesse meio-tempo voltei a frequentar bancas de revista — hábito que havia se perdido nos anos 2000 com a minha inocência romântica, quando eu ainda ouvia Oasis nos meus headphones, lia jornal impresso e colecionava as icônicas revistas da MTV.
Folhear cada página durante o café da manhã aos domingos se tornou uma forma prazerosa (quase tanto quanto sexo antes do café da tarde) de garantir uma leitura tranquila, longe do desconforto e dos riscos de distração das telas.
Não raras vezes, eu me via obrigado a pensar em como um incidente nacional poderia me reconectar com outras possibilidades de ser eu mesmo.
Mas, afinal, o que realmente nos faz sentir quem somos? Uma crise, uma tragédia ou apenas o simples ato de nos perdermos em goles esfumaçantes e pensamentos dispersos?
Talvez a resposta esteja justamente em redescobrir o prazer nas pausas forçadas da vida, quando o caos externo nos obriga a desacelerar e olhar para dentro — ainda que seja entre uma xícara de um expresso amargo e o último acorde de um saxofone.

