Quem são os bravos do lado oposto?


Um padrão de comportamento, próprio da geração nascida entre o fim dos anos 1970 e o início dos 1990, tornou-se evidente: ele se espalha pelas redes sociais, pelas estampas das camisas e pelas músicas que, ao som do violão, traduzem um sentimento nostálgico, em cores suaves de tons pastéis, e brando de melancolia.

Essa parcela da chamada Geração Y parece carregar uma espécie de desalento difuso: é gente um tanto infeliz, desconfortável com o cenário que a cerca e, não raro, atravessada pela sensação de desajuste social. O quadro pintado por esse bocado de “novos adultos” reflete-se na velocidade com que o mundo vem se transformando na pós-modernidade — essa fissura profunda, agônica e vertiginosa da modernidade. Está nas relações coletivas mediadas pelas tecnologias, no mercado de trabalho que exige uma excelência incessante, e no olhar perplexo do indivíduo que se enxerga fragmentado dentro de si mesmo.

Sem grande rigor, as expressões que adotam retratam jovens perdidos em seus próprios meios — frutos de uma classe média confortável, acostumada a esperar muito da vida, mas cobrada por vitórias que ecoam mundo afora. É como se estivessem à deriva num mar de promessas vencidas, vítimas de um processo considerado natural: o desdobramento previsível de um futuro que já nasceu exausto.

Contudo, o que se rebela contra a corrente é justamente a fração dessa juventude que começa a olhar o mundo com olhos novos. São os que recusam seguir os mesmos passos de seus antecessores, porque pressentem que o sucesso, tal como lhes foi ensinado, tem gosto de cansaço. A ambição, outrora virtude, torna-se suspeita. Já não possuem a disposição necessária para sacrificar a vida em nome de metas alheias — e, por isso, deixam que muitas delas se percam sem culpa. 

Em lugar da urgência, desejam serenidade; em vez da conquista, aspiram à inteireza. São os filhos da saturação, que ainda não aprenderam a lidar com as frustrações recentes da vida adulta.

Talvez seja este, de forma imprecisa, o perfil psicológico daqueles que vêm do “lado oposto” — os portadores de um mal-estar genuíno. A eles, só resta enfrentar este mundo de imprecisões, como quem luta com o próprio reflexo. Tudo se converte em uma questão de força interior: um duelo entre o que se é e o que se espera ser. Consequentemente, acabam sendo levados a interrogar os próprios sonhos e a desconfiarem das expectativas que os cercam.

E é precisamente aí que Los Hermanos se torna espelho. Diante de um exército de competidores e de uma multidão que marcha ao ritmo das exigências do presente, poucos ainda desejam ser “vencedores”. A banda captou, com rara sensibilidade, o estado de espírito dessa geração: “olha lá, quem acha que perder é ser menor na vida; olha lá, quem sempre quer vitória; e perde a glória de chorar; eu que já não quero mais ser um vencedor [...]”.

Há, nessas vozes, um anseio de fuga — não a fuga covarde, mas aquela que resgata o humano que ainda resta. Quando cantam “sei do incômodo e ela tem razão, quando vem dizer, que eu preciso, sim, de todo o cuidado”, confessam a necessidade de gentileza consigo mesmos. E quando se perguntam “e se eu fosse o primeiro a voltar pra mudar o que eu fiz, quem então agora eu seria?”, já não há arrependimento, mas contemplação: o reconhecimento de que crescer é perder versões antigas de si.

A principal e mais bela particularidade desse grupo é, talvez, a solidão. Não a solidão amarga, mas a que amadurece — essa que convida ao autoconhecimento, à introspecção, ao reencontro com o silêncio interior. “Sei que a tua solidão me dói; e que é difícil ser feliz; mas do que somos todos nós; você supõe o céu...”. Paradoxalmente, veneram a solidão: pertencem ao “Bloco do Eu Sozinho”, porque é na ausência do outro que descobrem sua mais terna companhia.

Faz-se necessário sentir-se só para, muitas vezes, sentir-se melhor e reconciliar-se com o próprio caos. Em cada um, há um desejo de quietude e de recomeço — um voo íntimo em direção à paz. “Solidão, foge que eu te encontro, que eu já tenho asa”, canta Marcelo Camelo, como quem entende que o encontro consigo mesmo é também uma forma de libertação.

A canção dos Hermanos é, sobretudo, feita para os que remam contra a corrente, para quem se recusa a seguir a manada. É o canto dos que desistiram de vencer e começaram, enfim, a existir. “Pois é, não deu; deixa assim como está, sereno; pois é de Deus; tudo aquilo que não se pode ver; e ao coração que teima em bater; avisa que é de se entregar o viver.”

Há em suas composições um sentimento de comunidade — mas uma comunidade silenciosa, tecida de olhares cúmplices, de feridas semelhantes. “Pra nós todo amor do mundo, pra eles o outro lado.” Curioso: a euforia dos shows era sempre o espelho de uma solidão compartilhada.

O heroísmo do “eu” cantado por Camelo desprende-se da lógica do mundo e se reveste de humildade: é o heroísmo do que resiste sem aplauso, do que se contenta em ser. “Eu não vou mudar, não; eu vou ficar são; mesmo se for só; não vou ceder; Deus vai dar aval, sim; o mal vai ter fim; e no final, assim, calado; eu sei que vou ser coroado; rei de mim.”

O amor — carta magna dos Hermanos — é a rosa dos ventos dessa legião dispersa. É ele que orienta os perdidos e sustenta os frágeis: “veja você, onde é que o barco foi desaguar; a gente só queria um amor; Deus parece às vezes se esquecer; ai, não fala isso, por favor; esse é só o começo do fim da nossa vida.”

E, de volta, a fuga como última esperança: “a gente corre pra se esconder; e se amar, se amar até o fim; sem saber que o fim já vai chegar”. O amor, aqui, é a única forma possível de redenção. Arrebata o mal, reata o humano e devolve à vida algum sentido. “Diz, quem é maior que o amor? Me abraça forte agora, que é chegada a nossa hora.”

Se foi apenas uma época, uma sensação, um encontro espontâneo entre a comunidade e seu arauto, a geração do malmequer jamais teve, enquanto o Los Hermanos existiu, um porta-voz tão sensível — capaz de reunir, em versos, todos aqueles que, um dia, se sentiram perdidos e, ao se reconhecerem na dor, finalmente se encontraram.